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Manifestações alérgicas em odontologia: metais, látex e resinas

No estudo das reações biológicas deve-se, inicialmente, entender os conceitos de alergia e hipersensibilidade. As reações de hipersensibilidade são desordens que têm origem numa resposta imune que se torna exagerada ou inapropriada, ocasionando lesões sobre células normais do organismo, enquanto alergia é definida como uma hipersensibilidade específica adquirida do sistema imune, podendo originar-se tanto de uma fonte exógena quanto endógena.

Essas reações podem ser previamente identificadas com a execução de uma anamnese adequada, com inclusão de questionamentos específicos como: “Você apresenta/apresentou algum tipo de reação alérgica a medicamentos, metais, borracha, resinas, ou outro produto ou material?”. 

Em caso afirmativo, De Menezes et al. (2009) recomendam o encaminhamento a um médico, alergista ou dermatologista, para avaliação mais aprofundada, com uso de exames complementares para confirmação das respostas alérgicas.

Dentre os materiais mais frequentemente associados às reações alérgicas podem ser citados os elásticos derivados do látex, resinas acrílicas e resinas compostas, bem como as diversas ligas metálicas. (DE MENEZES et al., 2009).

Metais utilizados na odontologia

Um ponto de fundamental importância, na avaliação do emprego de metais pesados na odontologia, é o seu potencial genotóxico, citotóxico e carcinogênico, uma vez que elementos metálicos como o níquel e o cromo apresentam resultados positivos relacionados à toxicidade genética. 

Alguns estudos in vivo mostraram que metais como o níquel e o cobalto ao serem liberados de aparelhos ortodônticos podem causar quebras no DNA de células da mucosa bucal.

Segundo Morais et al (2007) a liberação de íons metálicos origina-se por dissolução, desgaste ou, principalmente, por corrosão da liga. Sendo assim, a resistência à corrosão é importante na análise da biocompatibilidade. Os produtos de corrosão de ligas odontológicas são encontrados na saliva e na gengiva de pacientes, podendo interagir com os tecidos, por meio de diferentes mecanismos, como a toxicidade e a alergia aos íons metálicos liberados.

Dahl (1982) apud Morais et al (2007), afirma que a sensibilidade ao níquel é a causa mais comum de dermatite alérgica ao metal. Os sinais clínicos mais comuns são inchaço, vermelhidão, formação de vesículas, ulceração, necrose e sensação de ardência na boca.

As reações alérgicas na Odontologia, de modo geral, são as do tipo IV, que ocorrem após uma sensibilização prévia e reexposição do indivíduo ao alérgeno. A resposta regride após remoção do agente causador e reinicia quando os tecidos são novamente expostos ao mesmo. 

Dessa forma, o tratamento consiste na remoção do estímulo. Tais reações podem ser comprovadas através de testes de contato, que são empregados rotineiramente por dermatologistas e têm como objetivo avaliar a resposta da pele frente a diferentes substâncias. (DEVLIN et al.,1984 apud DE MENEZES et al., 2009).

Costa et al. (2003), sugere que o uso do aparelho ortodôntico com fios, braquetes e bandas de alto teor de níquel pode induzir hipersensibilidade ao níquel. Ressaltando a necessidade de diagnóstico da hipersensibilidade ao níquel antes que o tratamento ortodôntico seja estabelecido.

A Anamnese que indique história prévia de sensibilidade a metais deve servir de alerta ao profissional quando da intenção de submeter um paciente a um tratamento utilizando ligas que contenham alto teor de níquel.

O titânio

O titânio, apesar de ser muitas vezes mais caro do que o aço inoxidável, vem sendo utilizado para confecção de acessórios. Os braquetes de titânio puro apresentam maior tolerância tecidual, maior biocompatibilidade e resistência, quando comparados aos de aço inoxidável, já que esses apresentam níquel em sua constituição. (HAMULA et al., 1996 apud DE MENEZES et al., 2009). 

Os braquetes denominados “nickel-free”, geralmente compostos por cromo e cobalto, também podem ser empregados como material alternativo para pacientes com sensibilidade ao aço. Nesse contexto, não se pode deixar de ressaltar que os braquetes estéticos, sejam eles de cerâmica ou policarbonato, também servem como alternativa para pacientes com alergia ao níquel. (DE MENEZES et al., 2009).

Outro metal pesado largamente utilizado na odontologia é o mercúrio que, usualmente, é liberado em forma de vapor durante a manipulação do amálgama dentário, contaminando o ambiente e conferindo risco à saúde da equipe de saúde bucal. 

Ao ser inalado pode causar intoxicação, provocando danos irreversíveis ao sistema nervoso central, manifestando-se com sinais de ansiedade, desânimo, depressão, insônia, tremores, além de gerar hipertensão arterial, arritmias cardíacas, alergias, gengivites crônicas. 

A descontaminação do ambiente se faz pelos sistemas de controle, contenção e processamento de resíduos de amálgama e pelo tratamento do ar. As pessoas que trabalham com o mercúrio devem se proteger com os EPIs, principalmente máscara e óculos de proteção. (CAMPOS et al., 2012).

Látex

A sensibilidade ao látex é um emergente problema de saúde, que induz limitações ao trabalho dos profissionais da área da saúde, dificultando o uso de equipamentos de proteção, como as luvas cirúrgicas e as de procedimentos (protetoras), confeccionados com este material. Esses profissionais são considerados como grupo de risco devido à exposição intensa às proteínas do látex. (SUKEKAVA e SELL, 2007).

O látex é um líquido branco e enevoado usado na fabricação da borracha. (GOMES et al., 2012). As manifestações de reações adversas aos produtos que contêm látex são muito variáveis e influenciadas pelo tipo de sensibilidade, pela via de exposição, pela quantidade da exposição e por alterações individuais na reatividade do órgão-alvo. (MONTALVÃO et al., 2008).

A sensibilidade ao látex produzida por luvas cirúrgicas, cujas manifestações variaram desde dermatite de contato a verdadeira anafilaxia sistêmica, é prevalente nos profissionais de saúde. Algumas evidências indicam uma relação entre os sistemas imunológico e nervoso, resultando em maior sensibilização ao látex em pacientes com distúrbios neurológicos. (GOMES et al 2008 apud GOMES et al., 2012).

O primeiro passo para o diagnóstico de alergia ao látex é registrar o histórico clínico do paciente, pesquisando eventos prévios, associando ao teste cutâneo usando látex e/ou seus extratos. (LEVY et al., 1992 apud MENEZES et al., 2009). Faz-se prudente iniciar a pesquisa pelo teste radioalergosorvente (“RAST”) e, se negativo, proceder ao teste de contato. (WEISS et al.,1992 apud DE MENEZES et al., 2009). 

A exposição repetida ao látex de borracha natural é essencial para o desenvolvimento da sensibilidade. Imediatamente após o contato direto com esse material ou inalação de alérgenos transportados pelo ar – por exemplo o pó das luvas –, uma pessoa sensibilizada pode experimentar uma série de reações, tais como corrimento nasal, conjuntivite, dificuldade de deglutição, dermatite de contato, urticária generalizada, asma e anafilaxia, angioedema, rinite e taquicardia. (LEVY et al., 1992 apud MENEZES et al., 2009).

Sukekava e Sell (2007) relatou que dentre os profissionais questionados, alguns afirmaram afastar as borrachas, tanto do isolamento absoluto quanto das luvas, do contato com a pele ou mucosa dos pacientes interpondo vaselina ou guardanapo.

A prevenção primária da sensibilização ao látex implica em evitar a exposição, fato quase impossível, dado o grande número de produtos utilizados desde a infância (chupetas, calçados, etc). 

Como prevenção secundária, para evitar reações de hipersensibilidade, deve-se substituir os produtos à base de látex por aqueles que não o contenham. (LEVY et al., 1992 apud DE MENEZES et al., 2009).

Gomes et al. (2012), sugere ainda a conscientização como um fator primordial para a prevenção, já que os custos da alergia ao látex como doença ocupacional, envolvendo tanto os profissionais da saúde, que ficam impedidos de exercerem suas funções, como o atendimento a pacientes que exigem um protocolo específico para que não haja riscos à sua saúde, são altos. Considerando importante também, a elaboração de um protocolo para atendimento médico odontológico.

Resina acrílica

As resinas acrílicas são, também, amplamente utilizadas na Odontologia, nos aparelhos removíveis, de contenção e aparelhos fixos auxiliares, além de obturação de fendas palatinas, implantes e obturações endodônticas. 

Desde a década de 60, existem relatos de hipersensibilidade às resinas acrílicas, sendo, na grande maioria dos casos, associados à presença de um alto conteúdo de monômero de metilmetacrilato residual. 

Os polímeros acrílicos possuem propriedades únicas e variações em peso molecular ou configuração espacial dos meros na composição química. Suas propriedades físicas e mecânicas podem ser alteradas, dependendo desses fatores. 

O metacrilato de metila mesmo preenchendo vários desses requisitos não se enquadra totalmente dentro das exigências de um material biocompatível. 

Fisher (1954) apud Jorge et al (2004), dividiu as reações às resinas acrílicas utilizadas em odontologia em duas categorias: 

  • 1- dermatite alérgica de contato, que atinge dentistas e técnicos de prótese e 
  • 2-estomatite alérgica, que afeta os pacientes portadores de próteses. 

Weaver et al (1980) apud Jorge et al (2004), relataram casos clínicos relacionados com os componentes liberados pelas resinas, segundo os autores, as reações da cavidade bucal apresentam-se como ardência na língua, vermelhidão e erosão na mucosa.

Morais et al (2007) recomenda o cuidado no manuseio com o Poli metacrilato de metila (PMMA), que provoca doenças dermatológica de contato, devido a toxicidade do monômero (metacrilato de metila), como manchas nas mãos, irritações na pele, coceira, queimor e rachaduras. 

Os testes para avaliação de citotoxicidade indicam que as resinas acrílicas quimicamente ativadas apresentam, in vitro, de um modo geral, maior efeito citotóxico, quando comparadas às termopolimerizáveis e fotopolimerizáveis. (KEDJARUNE et al. 1999 apud DE MENEZES et al., 2009). Sugere ainda que quanto maior o tempo de eluição dos seus subprodutos, em especial o monômero residual, menor o efeito citotóxico exercido sobre as linhagens celulares testadas.

De Menezes et al. (2009), sugere manobras clínicas como: a confecção do aparelho com o mínimo de monômero residual, manter em água o aparelho confeccionado até o momento da entrega, para eluição do monômero residual, o uso local de anti-inflamatórios esteroides e em casos comprovados de sensibilidade o uso de aparelhos alternativos sem resina acrílica.

Resina composta

Devido a crescente busca por um material restaurador direto que mimetizasse as características dos dentes, pesquisadores desenvolveram as resinas compostas, constituídas por uma matriz polimérica, partículas de cargas inorgânicas e agentes de união. (BUSATO, 2005 apud FREIRE et al., 2012 ).

Monômeros não polimerizados provenientes das resinas compostas utilizadas durante os procedimentos restauradores podem ser considerados fatores etiológicos de reações imunológicas nos pacientes. 

Caso a reação de polimerização das resinas compostas não for realizada de forma completa, moléculas de monômero livre de trietileno glicol metacrilato (TEGDMA) ou 2-hidroxi-etil-metacrilato (HEMA) podem ser lixiviados da massa do material e serem diretamente responsáveis pelas reações de citotoxicidade e hipersensibilidade ocasionadas por estes compósitos. 

Os primers dos sistemas adesivos, que são compostos essencialmente por monômeros não-polimerizados utilizados em procedimentos restauradores com resinas compostas, podem também levar a um aspecto inflamatório dos tecidos orais. (VANDE, 2007; ORÉFICE, 2006; ANUSAVICE, 2005 apud FREIRE et al., 2012).

Quando avaliada a citotoxicidade das resinas compostas para colagem ortodôntica através do teste MTT, Nocca et al. (2006) apud De Menezes et al. (2009) demonstraram que as resinas fotopolimerizáveis apresentaram menor potencial citotóxico, quando comparadas às autopolimerizáveis.

Dessa maneira, recomenda-se o uso preferencial das resinas fotopolimerizáveis, por apresentarem maior biocompatibilidade, em vez de resina autopolimerizável. Em caso de suspeita de reação alérgica, deve-se encaminhar o paciente ao médico (alergista ou dermatologista) e evitar a exposição ao material irritante. (DE MENEZES et al., 2009).

O papel do odontologista 

A partir do exposto, é perceptível a fundamental importância do conhecimento por parte do odontologista sobre a composição dos materiais que utiliza na sua rotina clínica, bem como a possibilidade desses provocarem reações a si mesmo e aos seus pacientes. 

Devem estar aptos a reconhecer os sinais e sintomas de uma reação alérgica, bem como ter a capacidade de oferecer o devido suporte e encaminhamento frente a tal situação, trabalhando em conjunto com os profissionais especializados. 

Dessa forma, é imprescindível a adoção de medidas profiláticas e/ou a adequação do ambiente de trabalho e a proposição de materiais alternativos, priorizando a saúde geral do paciente e da equipe de saúde bucal.

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